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Crónicas, contos e confissões de uma solteira gira e bem resolvida que não cumpriu o papel para o qual foi formatada: casar e procriar. Caso para cortar os pulsos ou dar pulos de alegria? Provavelmente, nem uma coisa nem outra!
A propósito do dia de ontem, data em que se assinalou o Dia Internacional do Trabalhador, mas também o Dia da Mãe (efeméride que se comemora no primeiro domingo do mês de maio), trago-te um artigo do delas.pt que aborda o assunto, ainda um tanto ou quanto tabu, das mulheres que optam por não procriar.
Quanto a mim, não posso dizer que decidi não ser mãe, até porque esta opção nunca se efetivou de facto na minha vida. Posso, no entanto, confessar que a maternidade não é algo pelo qual suspire ou revire os olhos e tão pouco coisa sem a qual não me sinta realizada. A verdade é que, por nunca me ter deparado com uma realidade perante a qual tivesse que optar - com isso quero dizer que nunca engravidei -, ser mãe não é algo que me diga muito. Em parte, admito, devido a grandes traumas vividos com aquela que me pariu e a quem costumo chamar de progenitora em vez de mãe.
Na minha perspetiva, e acredito que na da maioria das pessoas que conheço, há uma linha que separa a mãe da progenitora. Ser progenitora resume-se a parir, tão simples quanto isso - até as fêmeas do reino animal possuem essa faculdade. Em contrapartida, ser mãe é isso (às vezes nem isso) e tudo o resto. É cuidar, é amar, é zelar, é defender, é educar, é abraçar, é mimar, é castigar, é matar e morrer por (melodramaticamente parafraseando). Ser mãe é tudo isso e mais alguma coisa: tudo o que sempre idealizei e almejei, mas que nunca vivenciei na primeira pessoa. Não ter o amor de mãe é das dores mais atrozes que um ser humano pode experienciar.
Tudo isso para dizer que, se for para ser uma má mãe, como a que tenho, mais vale não ser. Como gosto de frisar, "eu como mãe, sou uma excelente tia!". Sorte a minha? Quem sabe! Quero ser mãe? Prefiro que seja a vida a decidir, até porque a caminhar a passos largos para os 40, em pouco tempo procriar (ou não) deixará de depender da minha vontade, para passar a depender da boa vontade da mãe natureza. Preâmbulos à parte, deixo-te com o artigo mencionado no início deste post.
Dia de quem? Não quero ser mãe, obrigada!
Em Portugal, 8% das mulheres em idade fértil não querem ter filhos, segundo dados da Pordata de 2011. São cada vez mais aquelas que, apesar do estigma social, se identificam com o movimento “childfree” definitivo que, na Holanda, já chega aos 18%.
Ana Mateus, 32 anos, enfermeira, integra o grupo. “Nunca senti vontade e, com a minha profissão penso que não teria disponibilidade para dar a uma criança a atenção que ela requer e merece". Dizem-lhe muitas vezes que daqui a alguns anos se irá arrepender ou tentar engravidar a todo o custo, mas Ana discorda. Admite nunca ter sido fascinada por crianças: "Gosto de umas, de outras nem tanto. E depois de as ter é impossível devolvê-las", brinca.
Paula Figueiredo, 50 anos, marketeer, também não se revê na maternidade. "Nunca senti o desejo", garante. Na juventude, muitas das suas amigas até tinham definido com que idade queriam ser mães e os nomes das suas crianças antes conhecerem o potencial pai. Já a ela não lhe passava pela cabeça a possibilidade de ter filhos. "Enquanto elas não concebiam a ideia de não os ter", recorda.
Biologia ou ideologia?
Afinal, parece que a biologia não condiciona e obriga as mulheres a serem mães para se sentirem completas enquanto seres humanos.
Aliás, o mito do instinto maternal já foi deitado por terra nos anos 80 pela socióloga feminista Elisabeth Badinter. Segundo a francesa – que é mãe de três filhos – não existe vocação natural para a maternidade. As suas pesquisas sobre a gravidez e amamentação ao longo dos últimos séculos mostraram que a maioria das crianças era completamente negligenciada e entregue a amas-de-leite a troco de dinheiro. Para as mulheres da alta burguesia chegava mesmo a ser desprestigiante ocuparem-se da prole, enquanto que para as operárias, dada a jornada de trabalho, se tratava de uma tarefa impossível. Na maioria dos casos, eram vistas sobretudo como um par de braços extra e útil para ajudar na economia familiar.
Curiosamente, segundo dados o INE, 67% das mulheres que rejeita a maternidade aponta como principal motivo a falta de condições económicas para o fazer. Significa isto que são cada vez mais planeadas "o que se trata de um fator de desenvolvimento e positivo na sociedade", afirma.
No entanto, "a pressão mantém-se para que se continue a procriar, até por motivos demográficos e dado o envelhecimento populacional", alerta, "quando se devia ter em conta um fator muito importante: o desejo da maternidade".
A efetiva conciliação do tempo entre família e filhos e os restantes projetos de vida é um assunto mal resolvido na sociedade portuguesa, em que a partilha das responsabilidades domésticas e familiares penaliza especialmente as mulheres e agrava-se quando estas se tornam mães.
Mãe, mulher, pessoa
Luísa Beltrão, 47 anos, professora do ensino secundário, consciente do lufa-lufa que é ser mãe e profissional a tempo inteiro, foi adiando a maternidade. Quando casou, por volta dos 37, ainda ponderou engravidar. "Mas não aconteceu e eu tinha deixado claro ao meu marido que não me iria sujeitar a tratamentos de fertilidade". Hoje, acha que a natureza foi sua aliada. "Não é que não goste de crianças, mas adoro o meu estilo de vida". Pinta nos tempos livres, tem uma vida social intensa, e viaja sempre que pode. Nesta altura da vida dá sobretudo valor ao companheirismo e cumplicidade que partilha com o marido, se não tinha optado pela adoção.
Paula Figueiredo é da mesma opinião: "Costumava dizer, a brincar, que algumas pessoas querem é ser recordadas para a posteridade e, na impossibilidade de terem uma estátua no Marquês de Pombal, têm filhos". Segundo a marketeer, alguns pais são nitidamente incompetentes e geram filhos só porque "faz parte". "Ser mãe ou pai para mim é um enorme ato de amor, de quem põe os interesses da criança acima de tudo e, infelizmente, nem sempre é assim”, avança. “E ter filhos para ter alguém que cuide de nós na velhice pode até resultar em relações afetivas felizes mas não me parece um bom princípio, de todo".
E como fugiram da pressão social? "Tornei-me mestre em mudar de conversa!", diz Paula. "Mas na verdade nunca senti que existia uma grande expectativa sobre o facto de eu vir a ser mãe, nem que estava a impedir os meus pais do direito de serem avós, até porque já tinham uma neta". Além de que, desde cedo, os familiares perceberam e aceitaram que a sua natureza era diferente: quando devia estar a pensar em casar e engravidar foi estudar para o estrangeiro, algo inédito numa família tradicional como a sua.
Luísa Beltrão sempre recebeu o apoio da família, mas as colegas de trabalho nunca perdiam oportunidade para a questionar sobre uma possível gravidez. Calou-as com a alegada "infertilidade", "mas é uma estupidez pensar-se que uma mulher casada não possa optar livremente por um estilo de vida que dispense fraldas e biberões", opina.
Ana Mateus, por seu lado, vai sobrevivendo às indiretas da família. "Ajuda não ter uma relação estável", confessa. O que a irrita é a descriminação no trabalho. "Pensam que não tenho vida própria e que estou sempre disponível para trocar turnos ou fazer horas extraordinárias". Tal como a enfermeira, Paula Figueiredo também é muitas vezes considerada como presença segura quando é necessário ficar até mais tarde no escritório ou viajar. "Às vezes não custava, pelo menos, perguntar". Porque, demonstram as três: há vida além da maternidade.
De facto, há vida além da maternidade. E bem boa, por sinal. Palavra de quem não é mãe e não sabe se algum dia quer ser.
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