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Crónicas, contos e confissões de uma solteira gira e bem resolvida que não cumpriu o papel para o qual foi formatada: casar e procriar. Caso para cortar os pulsos ou dar pulos de alegria? Provavelmente, nem uma coisa nem outra!
Viva!
Plenamente ciente de toda a celeuma à volta deste que é, sem dúvida nenhuma, um dos temais mais quentes da atualidade portuguesa, na calha tenho uma crónica na qual abordo a minha perspetiva pessoal da eutanásia. Enquanto o vou escrevendo, que tal ir despertando o teu interesse pelo assunto com este texto instigante e fustigante da autoria de AB, ex-colega de trabalho e amiga desde o primeiro momento?
Boa leitura e, mais importante que isso, boa reflexão!
Não sou contra a eutanásia, desde que seja da vontade de quem vai morrer, porque geralmente só quem está a sofrer é que sabe a medida do seu sofrimento. Sou contra a forma como se quer lá chegar, como se quer seguir a direito na estrada da vida sem parar nas muitas curvas que ela tem: a curva de melhores condições nos cuidados paliativos; a curva de melhores apoios sociais às famílias e instituições; a curva da moralidade, para que famílias não se sintam impelidas a despachar os seus doentes, os seus velhos, os seus "empecilhos"; a curva da compaixão que nos leve a querer cuidar mais e melhor, a estar mais presentes na vida daqueles que precisam de nós; a curva da vergonha na cara, para que não descartemos aqueles que nos deram colo quando precisámos e ainda eram "válidos" para nos apoiar; a curva da gratidão pela vida que estes nos deram, pelo amor e dedicação com que cuidaram de nós desde que nascemos até nos tornarmos independentes.
Penso em tudo isto porque cresci num bairro onde havia muita proximidade entre as famílias e em criança ouvia adultos criticarem este ou aquele porque, diziam:
1) Mandaram a mãe/avó para um lar porque já não precisavam delas, depois desta ou aquela terem cuidado dos netos para que os pais pudessem trabalhar e viver sem preocupações;
2) Que fulano e fulana davam porrada nos seus idosos dentro da sua própria casa, porque estavam fartos de aturá-los;
3) Que queriam correr com eles para lhes ficarem com a casa onde viveram toda a vida;
4) Que este ou aquela ficava com a reforma dos pais/avós e depois nem comida lhes davam;
5) Que cicrano ou beltrano mandou a mãe/pai/avó para a terra porque já estavam velhos e davam trabalho;
6) Etc.
Penso nisto porque me parece que hoje o mundo está mais aberto do que nunca, temos acesso facilitado a infinidade de coisas e queremos vivê-las intensamente, com total liberdade de movimentos para viajar, divertirmo-nos e não termos que nos preocupar com os nossos doentes, os nossos velhos, os nossos dependentes. Há quem sinta que é tão fácil descartar uma pessoa, como um animal doméstico que diz amar profundamente.
Penso nisto enquanto aguardo que o Estado faça o que lhe compete primeiro, que é providenciar as melhores condições possíveis para aqueles que precisam de cuidados especiais e para que o peso para as suas famílias seja mais leve, por forma a darem amor e esperança aos seus doentes, em vez de os ajudarem a tomar a dolorosa decisão de morrer, partir para sempre, deixando um vazio que nunca será preenchido, mesmo naqueles que não o querem ver, porque a morte é definitiva, não dá para ir ali buscar um novo parente para substituir aquele que decidimos deixar ir assim como assim.
Penso que o Estado, os políticos e os supostos defensores imediatistas só podem deitar mão do recurso "eutanásia", só podem decidir sobre quem, como e quando se deve morrer, depois de fazerem este trabalho, depois de analisarem se, de facto, fazem tudo o que devem para dar qualidade de vida àqueles que querem mandar para a cova.
Penso eu que enquanto cidadãos não nos podemos focar só no sofrimento de quem quer morrer, mas em todo o conjunto de questões sociais que rodeiam o assunto "morte", morte voluntária, morte "matada", morte acidental... Morte! Capítulo definitivo do assunto "vida"...
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